Inédito
Era de nome que falavam. Dos nomes das pessoas, dos bichos, das coisas, mas principalmente das pessoas. Ou melhor, do seu nome.
Ele não gostava da escolha, nem poderia, coitado. Danada de decisão do pai, que se abestalhou com uma palavra bonita e jogou no filho, como se fosse marca, para a vida toda.
A moça _ que mal havia chegado da cidade grande e tentava mudar as coisas em meio àquele sertão perdido _ lhe dizia para dar nome ao cachorro da família, que sempre atendia aos assovios, e só.
Ele precisa de um nome, precisa de um nome, dizia a moça. Quem precisava de nome novo era ele, pensava. Onde já se viu batizar o filho de “Inédito”? Alguém, além dele, daquele menino franzino, de andar meio torto, sozinho em meio à caatinga, brincando com um cachorro sem nome, seria Inédito? É claro que não, respondia (antes mesmo de dar chance a outra explicação enfadonha), desconcertado, enfurecido, enquanto chutava o barro do chão.
Acabou se contentando com o “Detinho”, que sua santa mãe providenciou para pôr no lugar do Inédito, que ela não sabia pronunciar. “É muita letra pra um nome só”, dizia entre sorrisos, quase sem dentes.
Pela vontade da mãe, ele seria João, Antônio, Pedro, José. Qualquer nome que coubesse no juízo de um cristão e na boca de quem chamasse. Menos Inédito.
A moça bem que tentava controlar o sorriso. Ria mais pela fúria declarada do menino do que da infelicidade de levar pela vida aquela pecha ou da ingenuidade do pai, que achou fazer um favor à criança com nome lindo daquele.
Pense que no mundo inteiro, só há você. Você foi o primeiro, tentava a moça. E até que aquilo fazia sentido, combinava com a estranheza toda.
Não adiantava. O menino não levantava os olhos. Só batia com força nas pedras, socava o barro vermelho e balançava a cabeça, em negação.
Moça, a senhora tem nome bonito, de princesa _ Maria Amália. Olhe só, que nome mais do lindo! Eu nem ligo mais para o meu, até esqueci dele. Só lembrei agora porque a senhora disse pra dar nome ao cachorro. Mas pra que cachorro precisa de nome? Ele responde no assovio e pronto. Precisa de nome não, declarava, como quem implanta uma lei, a sua lei, naquele lugar _ que mesmo pobre, perdido no meio do mundo, era seu.
O cachorro chegou junto, olhou a criança, cheirou suas mãos e abanou o rabo, pedindo brinquedo, folia, afeto. Sem nome, era mais feliz assim.
A moça desistiu de tentar convencer aquele menino, tão mais forte que ela e tão calejado pela vida. Foi lá dentro da casa, onde ergueria o seu mundo, pegou o instrumento e desandou a tocar.
Sem licença ou despedidas, o menino levantou, assoviou e correu pelo terreiro, com o cachorro sem nome.
Era verdade o que ele dizia. Para que complicar as coisas? Ele era o menino, que brincava com o cachorro, no sertão que era todo seu. Ninguém precisava mudar aquilo, porque daquele jeito tudo corria bem, do modo que eles sabiam, da forma que conheciam o que nunca foi dito, o nome que não se falava: a felicidade.
Ele não gostava da escolha, nem poderia, coitado. Danada de decisão do pai, que se abestalhou com uma palavra bonita e jogou no filho, como se fosse marca, para a vida toda.
A moça _ que mal havia chegado da cidade grande e tentava mudar as coisas em meio àquele sertão perdido _ lhe dizia para dar nome ao cachorro da família, que sempre atendia aos assovios, e só.
Ele precisa de um nome, precisa de um nome, dizia a moça. Quem precisava de nome novo era ele, pensava. Onde já se viu batizar o filho de “Inédito”? Alguém, além dele, daquele menino franzino, de andar meio torto, sozinho em meio à caatinga, brincando com um cachorro sem nome, seria Inédito? É claro que não, respondia (antes mesmo de dar chance a outra explicação enfadonha), desconcertado, enfurecido, enquanto chutava o barro do chão.
Acabou se contentando com o “Detinho”, que sua santa mãe providenciou para pôr no lugar do Inédito, que ela não sabia pronunciar. “É muita letra pra um nome só”, dizia entre sorrisos, quase sem dentes.
Pela vontade da mãe, ele seria João, Antônio, Pedro, José. Qualquer nome que coubesse no juízo de um cristão e na boca de quem chamasse. Menos Inédito.
A moça bem que tentava controlar o sorriso. Ria mais pela fúria declarada do menino do que da infelicidade de levar pela vida aquela pecha ou da ingenuidade do pai, que achou fazer um favor à criança com nome lindo daquele.
Pense que no mundo inteiro, só há você. Você foi o primeiro, tentava a moça. E até que aquilo fazia sentido, combinava com a estranheza toda.
Não adiantava. O menino não levantava os olhos. Só batia com força nas pedras, socava o barro vermelho e balançava a cabeça, em negação.
Moça, a senhora tem nome bonito, de princesa _ Maria Amália. Olhe só, que nome mais do lindo! Eu nem ligo mais para o meu, até esqueci dele. Só lembrei agora porque a senhora disse pra dar nome ao cachorro. Mas pra que cachorro precisa de nome? Ele responde no assovio e pronto. Precisa de nome não, declarava, como quem implanta uma lei, a sua lei, naquele lugar _ que mesmo pobre, perdido no meio do mundo, era seu.
O cachorro chegou junto, olhou a criança, cheirou suas mãos e abanou o rabo, pedindo brinquedo, folia, afeto. Sem nome, era mais feliz assim.
A moça desistiu de tentar convencer aquele menino, tão mais forte que ela e tão calejado pela vida. Foi lá dentro da casa, onde ergueria o seu mundo, pegou o instrumento e desandou a tocar.
Sem licença ou despedidas, o menino levantou, assoviou e correu pelo terreiro, com o cachorro sem nome.
Era verdade o que ele dizia. Para que complicar as coisas? Ele era o menino, que brincava com o cachorro, no sertão que era todo seu. Ninguém precisava mudar aquilo, porque daquele jeito tudo corria bem, do modo que eles sabiam, da forma que conheciam o que nunca foi dito, o nome que não se falava: a felicidade.
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